Conheça os fundos multimercados e long short que mais renderam no 1º semestre
Os fundos multimercados conseguiram provar que não necessitam aguardar a tempestade passar para ganhar dinheiro
Por Júlia Lewgoy, Valor Investe
O cenário de tormentas atravessado pelos investidores acabou ajudando boa parte dos fundos multimercados no primeiro semestre de 2022, apesar da categoria ter acumulado uma fuga de R$ 61,8 bilhões e de alguns fundos famosos terem ficado no negativo.
À medida que os bancos centrais aumentavam os juros para conter a inflação no Brasil e no mundo, alguns gestores brasileiros apresentaram os seus melhores retornos da história, acostumados a lidar com o descontrole de preços de outros carnavais.
As melhores carteiras atingiram retorno de até 41% nos primeiros seis meses do ano, conforme um estudo feito por Marcelo d´Agosto, consultor financeiro e blogueiro do Valor Investe, com base em dados da plataforma Morningstar. É muito em comparação à alta de 5,4% do CDI, taxa bem parecida com a Selic, e à queda de 6% do Ibovespa, índice de referência da bolsa brasileira, na primeira metade do ano.
Fundos multimercados mais rentáveis no ano
Fund | Retorno no ano (em %) | Retorno em junho (em %) | Retorno em 12 meses (em %) | Risk | Patrimônio líquido (em R$) |
SPX Raptor | 40,83 | 3,71 | 49,60 | 16,61 | 3.053.024.795 |
Vista Multiestratégia | 39,11 | -5,24 | 40,84 | 27,97 | 1.054.485.576 |
XP Macro Plus | 29,09 | 5,91 | 37,00 | 11,58 | 1.222.943.616 |
Asa Hedge | 27,56 | 4,91 | 34,68 | 9,88 | 503.905.479 |
Kapitalo Gaia | 24,91 | 2,41 | 15,83 | 13,16 | 6.331.153 |
ESH Theta | 22,14 | -0,74 | 30,41 | 12,90 | 129.924.620 |
Capstone Macro | 21,04 | -2,33 | 28,44 | 10,15 | 1.045.547.567 |
Vinland Macro Plus | 20,21 | 2,04 | 27,23 | 8,50 | 735.577.514 |
Bahia Mutá | 19,81 | 1,71 | 18,26 | 8,27 | 49.621.488 |
Mar Absoluto | 18,96 | -1,38 | 10,53 | 12,08 | 914.328.393 |
Fonte: Estudo de Marcelo D´Agosto, consultor financeiro e blogueiro do Valor Investe, com base em dados da Morningstar
Os fundos selecionados são distribuídos pelos principais bancos e plataformas de investimento, têm histórico de pelo menos 12 meses e estão efetivamente disponíveis para os investidores.
Os fundos multimercados conseguiram provar que não necessitam aguardar a tempestade passar para ganhar dinheiro. Eles são livres para pintar e bordar, com ações, commodities, juros e moedas, no Brasil e no mundo. Conseguem fazer operações compradas e vendidas, no jargão do mercado financeiro, ou seja, investir esperando que os ativos subam ou caiam.
Algumas operações são arriscadas e desaconselhadas para investidores iniciantes, mas aliadas dos gestores em momentos de alta volatilidade. É importante lembrar que rendimento passado não é garantia de rendimento futuro, mas deixar o dinheiro investido em fundos multimercados de bons gestores por alguns anos é uma forma inteligente de acumular patrimônio. Para isso, é preciso conhecê-los e entender a sua estratégia.
Os fundos multimercados que se deram melhor no primeiro semestre apostaram na alta de juros no mundo, esperando que os bancos centrais aumentariam as taxas na batalha contra a inflação. Além disso, eles investiram prevendo a queda das bolsas dos Estados Unidos, consequência do avanço de juros. Alguns dos gestores que lideraram o ranking continuam fazendo essas duas apostas.
É o caso da SPX Capital, em primeiro lugar no ranking. O fundo SPX Raptor rendeu 41% nos primeiros seis meses do ano. “Continuamos com posições favoráveis à alta de taxas nos países onde acreditamos ainda haver grande desequilíbrio entre as condições econômicas e os preços de mercado, com maior alocação de risco em nomes específicos em países emergentes”, afirmou a casa na carta do gestor dos fundos multimercados macro de junho, assinada por Albano Franco.
Nos mercados de ações, a SPX disse que está vendida (apostando na queda) em Estados Unidos, Europa e Brasil e comprada (apostando na alta) em China. “O ponto de inflexão dos mercados de risco pode não estar tão perto, já que um novo tema vem ganhando força: a proximidade de uma recessão nos EUA”, afirmou. “Parece que a questão não será apenas se veremos um ‘pouso forçado’, mas sim qual será a duração, a profundidade e as consequências da recessão que se avizinha.“
Sobre o Brasil, a gestora afirmou que a tarefa do Banco Central de controlar a inflação parece ficar cada vez mais difícil, mesmo já tendo levado a Selic até 13,25% ao ano. “Assim, o mercado vai pressionando o BC, adicionando os riscos políticos e fiscais à equação, como argumento para projeções altistas da taxa básica”, disse.
A aposta mais importante dos fundos XP Macro Plus e Asa Hedge, em terceiro e quarto lugar no ranking, nessa ordem, também foi e continua sendo em juros globais. As carteiras renderam 29% e 28%, respectivamente, na primeira metade do ano.
“A inflação e a alta de juros no mundo é o grande tema que vem norteando a alocação. Apostamos em juros futuros com vencimento mais curto e isso deu bastante dinheiro para a gente e para outros fundos”, afirma Bruno Marques, gestor da estratégia de fundos multimercados da XP Asset.
Os dois fundos, da XP e da Asa, também estavam e seguem vendidos em bolsas dos Estados Unidos, projetando que a alta de juros causará uma recessão econômica. “Estamos apostando que o S&P ainda vai cair mais no mercado futuro”, diz Marcio Fontes, gestor do ASA Hedge. “Quando os Estados Unidos se aproximarem da recessão, no final do ano que vem, as ações terão um prêmio de risco a mais.”
No Brasil, tanto o fundo da XP quanto o da Asa estão comprados em títulos do governo atrelados à inflação com vencimentos intermediários e zerados em bolsa. “Alocar no Brasil está muito difícil. A economia está mais forte do que o esperado e a inflação dá sinais de resiliência, com estímulos irresponsáveis”, afirma Marques, da XP. “A bolsa brasileira está com prêmio, mas o cenário de longo prazo não está fácil.”
Fontes, da Asa, afirma que o cenário no Brasil está mais incerto do que nos Estados Unidos e que não sabe se o ciclo de alta de juros por aqui está acabando. “Enquanto o problema da inflação não for resolvido, os ativos de risco não vão performar bem”, diz. “A bolsa está com múltiplos historicamente baixos, mas o cenário macroeconômico não está bom. Nenhum dos dois principais candidatos à presidência discute o ajuste das contas públicas. Por isso, preferimos não apostar na bolsa brasileira.”
Fundos long short
Os fundos multimercados da classe long short, que compram uma ação e vendem outra ao mesmo tempo, atingiram retornos abaixo dos multimercados clássicos no primeiro semestre. Contudo, eles também tiveram um bom desempenho em comparação ao CDI e ao Ibovespa, de até 10%.
Fundos long short mais rentáveis no ano
Fund | Retorno no ano (em %) | Retorno em junho (em %) | Retorno em 12 meses (em %) | Risk | Patrimônio líquido (em R$) |
Ibiuna L&S STLS | 10,24 | 0,43 | 9,09 | 9,86 | 625.464.529 |
Navi Long Short | 9,24 | 5,05 | 12,50 | 6,34 | 328.427.823 |
Moat Capital Equity Hedge | 8,98 | 1,19 | 15,39 | 7,69 | 573.632.174 |
XP Investor Long Short 60 | 8,28 | 2,36 | 3,79 | 6,49 | 21.976.147 |
BRAM Long and Short | 6,82 | -0,11 | 6,96 | 3,01 | 128.030.999 |
Sharp Long Short Feeder 2X | 6,68 | 1,03 | 12,24 | 2,60 | 1.491.126.365 |
BTG Absoluto LS | 6,41 | 0,99 | -10,03 | 9,47 | 405.753.207 |
Apex Equity Hedge | 6,21 | 0,20 | -0,25 | 4,61 | 304.242.862 |
Safra Kepler Equity Hedge | 6,12 | 1,97 | 2,09 | 3,81 | 320.882.045 |
Sharp Long Short | 5,69 | 0,90 | 9,60 | 1,50 | 153.976.707 |
Nessa modalidade de produto, os papéis comprados tendem a se comportar de maneira parecida aos papéis vendidos, mas não igual. Assim, o gestor espera que o ativo que foi comprado tenha um aumento maior do que o ativo vendido e ele ganha com essa diferença.
Um exemplo: um gestor que comprou Lojas Renner, que caiu 6% nos primeiros seis meses do ano, e vendeu Magazine Luiza, que recuou 68%, ganhou dinheiro com essa operação. Já um que comprou Bradesco, que ficou estável, e vendeu Banco do Brasil, que subiu 22%, perdeu dinheiro.
As ações podem ser do mesmo setor ou não. Por exemplo: o produto pode estar comprado em Localiza, por achar que está barata, e vendido em Lojas Renner, por achar que está cara. São duas companhias que dependem da confiança do consumidor brasileiro, mas de setores diferentes. Já estar comprado em Ambev e vendido em Vale, por exemplo, não faria sentido, uma vez que a primeira depende da economia brasileira e a segunda, do preço do minério de ferro no exterior.
Cada fundo long short tem uma estratégia bem diferente do outro. Os dois produtos que ficaram em primeiro e terceiro lugar no ranking, Ibiuna L&S STLS e Moat Capital Equity Hedge, nessa ordem, seguiram um caminho em comum. Eles ficaram comprados em companhias de valor e vendidos em empresas de crescimento. Companhias de valor são aquelas representantes da velha economia, como bancos e exportadoras de commodities, por exemplo. Já empresas de crescimento têm parte do seu valor na expectativa de futuro no longo prazo, como as companhias de tecnologia, por exemplo.
André Lion, sócio responsável pela área de ações da Ibiuna, conta que o fundo long short da gestora escolheu pares de ações que se beneficiariam com a alta de juros nos Estados Unidos.
“Enquanto as companhias de crescimento seriam prejudicadas, como as de tecnologia, empresas de valor teriam oportunidades, como Petrobras, Itaú e companhias do setor de energia renovável, como Auren e Omega”, afirma. “Continuamos vendo muito valor nessas empresas.”
As companhias vendidas não são ruins, conforme Lion. Apenas estão caras, na análise da casa. “Seguimos reticentes com as fintechs, por exemplo. São empresas boas, mas o problema é o preço delas.”
O fundo long short da Moat também ficou comprado em companhias com fluxo de caixa mais estável, dos setores de bancos, petróleo, proteínas e serviços essenciais, como energia.
Atualmente, está difícil de achar assimetrias de preços, que levam os fundos long short a ganhar dinheiro, entre as ações dos Estados Unidos, afirma Adriano Leite, sócio e responsável pela área de relações com investidores da Moat. “As companhias ainda podem sofrer uma compressão de lucros maior do que o mercado está esperando. Com a inflação, provavelmente as empresas vão crescer menos e ter custos maiores, e achamos que isso ainda não está totalmente nos preços”, diz.
A gestora prefere buscar assimetrias de preços entre os papéis na bolsa brasileira. “Estamos com a bolsa muito barata e com empresas com fundamentos melhores. Não há um gatilho que vai fazer a bolsa andar, mas vemos assimetrias bem favoráveis”, afirma. “Ter bolsa brasileira é melhor do que ter bolsa americana”, diz.
Agora, a casa está posicionada em companhias que acompanham o desempenho da economia brasileira e que estão com o balanço em dia. “Estamos à frente do mundo na alta de juros, a inflação provavelmente já chegou ao pico e em algum momento vamos discutir corte de juros”, afirma.