Rali na Bolsa: até onde vai o otimismo do mercado?
Mesmo com os dois turnos da eleição liderando a pauta, em outubro o Ibovespa acumula alta de 5,7%
Por Raquel Brandão
Mesmo com incertezas naturais de um período eleitoral e o cenário externo desfavorável, a Bolsa brasileira segue jogando no campo positivo no acumulado dos últimos dias (+5,7% em outubro), com direito a altas expressivas em alguns pregões. Um exemplo é o pregão de 3 de outubro, quando avançou 5,54%, reagindo ao resultado das urnas para a disputa presidencial que levou Luiz Inácio Lula da Silva (PT) e Jair Bolsonaro (PL) para o segundo turno, no próximo dia 30. Mas será que esse movimento de alta vai permanecer?
Analistas ouvidos pela Exame Invest acreditam que o bode não saiu da sala, ou seja, incertezas ainda rondam o mercado, mas a indicação é de que o Ibovespa está, sim, “atrativo”. O Brasil virou opção importante entre os emergentes e ficou em relação relativamente boa e barato, observa Matheus Tarzia, gestor de ações da Neo Investimentos. O Ibovespa é negociado atualmente a um múltiplo de 6,9 vezes, considerando a relação preço/lucro, abaixo de um patamar de 8,5 vezes que se observava há mais de um ano.
“A eleição acontecer já tira a neblina da estrada e conseguimos enxergar para frente o que vai acontecer. O que estamos vivendo agora é mais um ajuste de curto prazo e pode acontecer mais um pouco, com os fatores de risco que melhoraram um pouco”, diz Tarzia, mas pondera que alta de longo prazo já “depende mais de cada história” dos papéis negociados.
“Estamos vivendo um momento em que a sincronia do ciclo econômico global vai diminuir um pouco, porque China talvez não cresça tanto, Europa muito fraca e Estados Unidos convivendo com problemas de inflação próprios”, diz Alexandre Silverio, CEO da Tenax Capital, gestora multiestratégia fundada neste ano e que alcançou neste mês R$ 1 bilhão sob gestão.
Para ele, o cenário externo pode ter maior impacto para o câmbio, mas ainda assim o efeito parece ser mais limitado. “O PIB brasileiro está blindado, a política monetária está blindada e, por consequência, o call de bolsa está mantido”, afirma, destacando que o Brasil se adiantou na subida dos juros e já pode começar a vislumbrar cortes em meados de 2023. “Isso torna o Brasil atrativo e o ‘call’ de varejo e consumo, positivo.”
A visão mais otimista com a Bolsa brasileira coincide com levantamento do Bank of America (BofA) feito neste mês com 36 gestores da América Latina, em que 68% dos participantes disseram querer aumentar sua exposição ao mercado acionário local nos próximos seis meses, o maior valor desde que a pesquisa do BofA começou a ser realizada em 2018.
Para 66% desses gestores ouvidos pelo banco, o Ibovespa pode chegar a 130 mil ou mesmo 140 mil pontos no fim de 2023, o que representaria um prêmio de 12% a 20% sobre o patamar atual do índice, que terminou o último pregão a 116.274 pontos.
Os 140 mil pontos também viraram a projeção da equipe do Santander, que passou a acreditar mais em um “soft landing” para a economia global e ver um ambiente interno de redução de inflação e início de corte de juros. “Acreditamos que o mercado poderá começar a precificar mais cedo os cortes nas taxa de juros, uma vez que a inflação geral pode desacelerar significativamente durante o primeiro semestre de 2023. Além disso, nossa pesquisa indica que, após os últimos quatro ciclos eleitorais no Brasil, os rendimentos dos títulos do governo sofreram uma compressão em cerca de 60 bps (pontos-base) nos três meses seguintes. Acreditamos que estes podem ser catalisadores positivos para as ações cíclicas domésticas”, escreveu a equipe do banco em seu relatório mais recente, divulgado em setembro.
Quais são os riscos?
Embora as pesquisas mostrem uma disputa mais acirrada entre os candidatos à presidência, os analistas acreditam que as eleições, em si, não são o fator de maior impacto para as negociações na Bolsa, embora esperem, sim, alguma reação no pregão seguinte ao segundo turno. “Eleição é um ponto importante, mas não determinante. O pós é mais importante. Lockdown na China, guerra, inflação e juros subindo em patamares extremamente elevados globalmente vão, sim, influenciar”, afirma Enrico Cozzolino, head de análise e sócio da Levante Investimentos.
Sergio Goldman, gestor da Esh Capital, também não vê razões para a Bolsa despencar após eleições, com o mercado olhando mais para o cenário externo. “Juros no mercado americano impactam mais. A gente já sabe que vai subir só não sabe até quanto. Esse é o grande drive pro mercado nos próximos dois ou três meses.”